10 abril, 2010

receita de pastéis de massa tenra

Alfredo adormecia à medida que perdia a consciência. O défice de atenção de Aníbal permite-lhe pensar em paio às sextas-feiras santas. Rolando perdeu a fé na passada terça-feira. Alfredo acordava à medida que abria as pálpebras. Aníbal queria ser bombeiro quando crescesse. Rolando aprendeu a tocar acordeão e actua aos sábados no seu restaurante. Aníbal é portageiro, profissão que lhe permitiu reencontrar Alice. Alfredo casou com Alice. Aníbal anotou o número de telefone de Alice no envelope com a conta da luz. Pelo anoitecer, Alfredo disse a Alice que ia ver o Benfica ao restaurante de Rolando. Aníbal telefonou a Alice, que telefonou a Rolando, que comunicou a Alfredo que Alice estava ao telefone, ao que Alfredo disse que não podia atender, pelo que Rolando informou Alice de que Alfredo não podia atender, o que levou Alice a pedir a Rolando que dissesse a Alfredo que tencionava aproveitar o facto de Alfredo estar a ver o Benfica para ir visitar a mãe a Alfragide, que era onde morava também Aníbal, que dali a menos de uma hora recebia Alice em cuecas e robe.

crónicas de pó de talco (ora pro nobis peccatoribus, nunc, et in hora mortis nostrae)

O meu cansaço mede-se em amêndoas cobertas de chocolate branco, em retalhos de pão untados de manteiga ou atapetados de queijo, em palpitações e vertigens de óbito próximo, em pontadas de artérias em ruína, em bicicletas crucificadas de encontro à parede de uma garagem, na arrecadação um capacete encarnado e um par de luvas, em brotoejas de ventre flácido a tombar como toucinho sobre o cós das calças, em desequilíbrios da forma, em ausência de simetria, em incapacidade de amar, em indigência celular, em secura do olhar, pelo crepúsculo cala-se-me o falar. Olho-te e pergunto-me o que viste de tão prometedor no que sou.

06 abril, 2010

Crónicas de pó de talco (presto)

Dói-me aqui. Dói-me além. Por vezes acolá. Aos sábados alhures. Em nenhures. Dói-me a perna. Do joelho ao calcanhar. A cabeça. Após o almoço dói-me assim. Depois assado. Ao fundo. Entre os dedos. No alto. Entre as orelhas. O peito dói-me amiúde. A nádega esquerda de manhã. A direita à tarde. À noite o canal. Custa-me obrar. E urinar. Sabe Deus.

04 abril, 2010

crónicas de pó de talco (allegretto)

De forma que genuflecti diante do Senhor com a presteza de uma ginasta de Xangai, o missal entreaberto na mão esquerda e a persignação igualmente lesta a desarrumar a poalha que tomba de santos sofridos e talha dourada na atmosfera do templo. A redenção que tudo lava. O cordeiro de Deus a fitar-me do topo do altar, creio que ainda lhe ouvi um gemido. Depois levantei-me e fui às putas.