21 abril, 2008

nós

Vejo-te debruçada num varandim de ferro verde. O Alva corre em tumulto aos teus pés e há um fragor de água e rochas. Não me vês. Olho-te daqui, na amurada sobranceira de um galeão de saibro, choupos e alcatrão, os pavilhões das serranias hasteados em mastros de xisto, entre silvados e giesta. Os teus olhos estendem-se a montante em melancolia-mel. Há cornucópias no teu cabelo à medida que a tua mão de leite se ergue mansa até aos lábios finos. Uma carícia pensativa. Vejo-te na moldura do ar húmido, o recorte do teu rosto macio na direcção dos seixos. Abraço-te à distância. Sentes-me? Adivinhas-me no teu encalço? Lanço a âncora aqui mesmo, neste recanto de afluente submisso. Entrego-me aos caprichos das tuas madeixas de anjo, adernando aos poucos num abandono doce.
- Gosto tanto de ti – dizes-me. – Quero ficar contigo.
Uma prece íntima, um tremor do peito, uma sede de nós, eu, tu, nós, um sussuro morno numa viela da orelha, o teu olhar a envolver-me em ternura. Encontrei-te. Cheguei.

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