11 agosto, 2012

salão playboy

H avia quatro camisas castanhas de manga curta com pequenos bolsos que anunciavam bordaduras de nomes de samurais alentejanos. Joaquim, Fernando, António. Estes nomes. Talvez. Os três de risco desenhado sobre as curvas das orelhas, fios de cabelo domados a borrifos de brilhantina. Um ribatejano apenas. José. Talvez. Há tantos anos. Denunciava-se com as patilhas brancas a apontarem as narinas numa imperfeição de escalenos e por um arquear de joelhos próprio de quem em tempos rabejara. Por vezes um pasodoble num assobio de melro. Havia pentes que espreitavam dos bolsos. O contínuo suspirar metálico de tesouras entre calos, lâminas tão perigosas como a espada de Yoshiteru. Afiava-as um amolador que aos domingos de manhã passava uma flauta de Pã pelos beiços afilados. De nascente a poente. De poente a nascente. Havia um cheiro de sovacos de proletário, de laca e Aqua Velva, tufos de cabelos pelo chão de linóleo que os pés dos samurais iam arrumando à medida que descreviam piruetas. Um quebra-nozes de subúrbio em redor de cadeiras que acomodavam cabeças a nascerem de batas cinzentas, sobre pescoços protegidos por toalhas surradas. Um, dois, três golpes de toalha na napa do estofo.

- Queira sentar-se. Então como é que vai ser? – e um odor vago a guisado e a Definitivos no hálito.

Seria curto. Orelha destapada. A delicadeza do pente quando tudo estivesse acabado, as cerdas de um pincel a espalharem talco pela nuca, o suão do secador que enfunava a poupa em ademanes de retrato barroco, um ténue inclinar da cabeça como despedida. E a alma muito mais redimida do que à saída da igreja de Queluz, depois de um acto de contrição tão oco como o tubo de plástico através do qual soprava pedacinhos de papel mastigado ao investir contra exércitos imaginários no quintal da minha avó. Tenho muita pena de Vos ter ofendido, mas tenho ainda mais pena de ter visto partir os samurais, um após outro, para o mesmo ocaso onde um dia acabaria por depositar a infância.