02 fevereiro, 2007

leannán-sidhe, intermezzo

Salmão baço, as sancas da cozinha são em salmão baço. Das paredes ressumam bolores, veios de humidade negra, úlceras de caliça e perto do fogão as manchas de uma golfada de óleo candente. Pescadinhas de rabo na boca. Sobre um dos bicos do fogão uma cafeteira e nela borras movediças. Pegas de pano e lã, frasquinhos de sais de frutos, um arco-íris de medicamentos dentro de uma caixa de plástico e um transístor de ventre suturado por um elástico baio. As moscas recolhem ao globo de vidro do candeeiro para morrer, uma mosca, duas moscas, três, quatro, cinco, seis, as patas tísicas voltadas para cima. Por fora, numa translação bêbeda, uma borboleta, Smerinthus ocellatus. A lâmpada hesita e com ela uma garrafa de licor de ginja na prateleira mais alta, um pequeno cesto com nêsperas na prateleira mais baixa, quatro ripas de pinho que formam uma casa e na varanda uma vela lilás e uma caixa de fósforos Quinas. Os pratos repousam molhados em três sulcos nas varizes do mármore. E as tuas mãos desaparecem na espuma enquanto uma esfera de sabão levita numa indiferença de planeta estéril. Uma bata e chinelos de pano. Tu. Eu. Isto.

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