18 agosto, 2009

rés-do-chão

Acordei espesso como o manto de cristais de gelo sobre o torreão do Palácio da Pena. A colcha de lavores celestes que está sempre lá mesmo quando não está. Há um velho que me fita do espelho, uma ironia de desembargador jubilado nas sobrancelhas, um pequeníssimo conclave de baba nocturna a um canto da boca, que liberta miasmas de alho e queijo, de inércia e morte difusa, de abandono e capitulação, não dispare, rogo-lhe que não dispare, não me enforque, isso é que não pode ser porque vesti estas calças lavadas, telefone à minha mãe e diga-lhe que me faça um prato de arroz doce. Ei-lo. O homem prenhe de princípios que caminha com olhos meridionais, uma teimosia de pombo urbano a extorquir restos de papo-seco aos interstícios dos paralelos, a espinha vergada ao descalabro do ventre, o couro a escalavrar-se de ano para ano, parabéns a você nesta data querida muitas felicidades muitos anos de vida, ide todos para os tomates mais essa lírica de contentamento colhido em vasos de marquise, amassado em alguidares de plástico e servido aos domingos em travessas de borossilicato. Um bilhete para a primeira fila do supremo enfarte no tlim do microondas. Tlim. Sim? É o colesterol. Bom dia.